segunda-feira, 23 de novembro de 2009


Ele abriu a porta quase como num chute. Passou por ela e nem se virou para fechá-la. Simplesmente bateu-a com toda a energia potencial acumulada no seu braço.
Jogou sobre o sofá a maleta de trabalho, quase arrancou o pescoço ao desfazer a gravata e jogou-a no meio da sala. Saiu pelo corredor bufando, tremendo de tanta raiva. Se não fosse pela sua tez morena, estaria mais vermelho que a maçã que comera pela manhã.
Entrou na cozinha, puxou uma das cadeiras de mandeira da mesa e sentou-se bem no centro da copa. Arrancou os primeiros botões de sua camisa na tentativa de abrí-la para respirar melhor.
E gritou. Segurou no assento e gritou o mais alto que pôde. Com toda a raiva e angústia que faziam em seu peito um buraco enorme. E continuava gritando. Atéque suas cordas vocais não mais aguentassem e ele fosse obrigado a se calar. E assim aconteceu.
Fraco, ele caiu recostado na cadeira. Sem mais força pra nada. Só curtindo o vazio interno e olhando pro nada. Mal respirava. Quando o cheiro do perfume dela invadiu as narinas dele. Seu peito nu arquejou sobre o espaldar da cadeira.
Ele num esforço mortal, desceu a cabeça e olhou para frente. E ela estava lá. Vestia um vestido preto justo. Os cabelos negros curtos rentes ao pescoço. O olhar penetrante de pena.
Ele falou, mas ninguém escutou nada. As cordas vocais haviam desistido de pronunciar as palavras dele.
Ela levantou o dedo e colocou em cima de seus lábios. Aproximou-se e se sentou em seu colo, de fente para seu rosto. Segurou em seu pescoço e ficou olhando em seus olhos, ora para o direito, ora para o esquerdo. E foi beijando-o mansamente. Do manso ao intenso. Até que ele levou as mãos às coxas dela e sentiu o prazer da carne.
Cada toque dele nela, cada beijo dele no seu corpo, a pressão que as mãos exerciam sobre a pele.
Tudo de melhor que podia ter acontecido para que ele se arrependesse de tudo.
E isso certamente aconteceria se não fosse o fato de que ela não estava realmente ali. Que ele estava de novo no limite entre o real e o imaginário. Aí ele começou a chorar louca e absurdamente. Frustrado, angustiado, decepcionado, sozinho. Tudo pra ele que fosse real demais, era mais provável que fosse perdido. Sumido.
Ele, chorando até que as lágrimas secassem, foi até a sacada e ficou ali respirando o ar da madrugada. Com as mãos nos cabelos, o peito arquejante, e as gotas que seus olhos derrubavam, tudo o que ele tinha, foi carregado vento da noite sandia.

2 comentários:

  1. Te vi no blog da Gabi. Adorei seu texto!!!
    Muito envolvente!!!

    Beijos =*

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  2. "Tudo pra ele que fosse real demais, era mais provável que fosse perdido"

    Gostei dessa frase viu!


    beijos

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