quinta-feira, 28 de janeiro de 2010


Naquele dia ele QUIS sumir para o outro mundo. Para aquele em que a praia de areia fina e branca o esperava. Fresca.. úmida. O mar de águas prateadas, de uma temperatura não fria, mas que refrescava o corpo quente. Os ventos, as brisas, mornas, arrastavam os cabelos castanhos dele para um lado e para o outro. De olhos semicerrados ele ficava, para o caso de algum grão de areia quisesse se aventurar nas suas negras íris. A bata branca esvoaçava. A calça, que não era jeans, mas de um tecido mole, também dançava no seu corpo.
Virou a cabeça de um lado a outro procurando aquela figura que o acolheria e conversaria e o escutaria. E a viu. Estava sentada numa cadeira.. comum. Feita de madeira, com um alto espaldar. Sob a sombra de algumas árvores que cercavam a praia. Vestia um vestido branco, longo, os pés desnudos, iguais aos dele, pisavam levemente, quase que flutuantes na areia. Os cabelos negros iam na direção do vento. Longos e cacheados eles eram. Os olhos, um castanho outro mel.
Ele correu em sua direção e deitou sua cabeça no colo dela. Susto? Não, ela já esperava. Ela já sabia.
"O que aconteceu Mateus?" - Ela perguntou sem fazer um único movimento com os lábios.
Mateus esperou um pouco para responder. O som da voz dela era tão confortante, tão assegurador, era tão maternal. Um quê materno que ele nunca tivera.
- Eu não fui feito para o amor.
Estabeleceu-se um silêncio nesse momento. Até os ventos se silenciaram. As ondas pararam de quebrar e os pássaros pousaram mais perto para escutar.
"Estou disposta a escutar seus argumentos para tal conclusão".
- Quando amo, quando desejo uma pessoa mais que a minha própria existência, sempre saio machucado.
"Explique".
- Amar, para mim, é como nadar no mar. As marolinhas me deixam fogoso. Num estado de êxtase. Até vir a onda que quebra na minha nuca e me faz rodar. Faz-me perder o ar. Faz-me perder os pensamentos. Essas águas, por mais que inconstantes, levam e trazem de volta cheiros, lembranças, costumes antigos, um eterno viver com o passado. Essa inconstância constante me afoga nas lágrimas e nos soluços do próprio mar. A mudança da lua, da maré, machuca-me o peito por causa da pressão, ou rala meus joelhos no raso que antes era fundo.
"Isso não acontece só quando se ama alguém Mateus. É a vida. O eterno constante do inconstante. O eterno viver em todos os tempos. Prendendo-se em um, tentando esquecer os outros. Sempre cairá, sempre sufocará, sempre se afogará. O sempre, o eterno, o nunca, o jamais, o ontem, o hoje, o agora, tempos, ondas que sempre quebram no mar do tempo. É a vida."
- Não. A minha vida é a terra. É me enfiar nos buracos, subir os morros, prender-me nas raízes.
Por isso me machuco no mar. Por isso amar é igual a essa imensidão prateada. Mais inconstante que a terra. Mais viajante que a terra. Mais dramaticamente molhado que a terra. Machuca mais que a terra.
"Por que crê nisso? Por que acredita que ele te machuca mais? Sendo que essa vastidão é terna, morna, e tão, tão transparente? Tão mais sincera e transparente que sua opaca terra?"
- Porque a opacidade é bruta e real. Essa transparência ilude e persiste. Suas ondas de fantasia grudam no meu corpo. Mesmo saindo dele, eu as sinto no corpo.
Ele se levantou e se virou para o imenso azul que se abria diante dos seus olhos.
"Ainda não entendi."
- A terra afunda no mar. Assim como eu me aprofundo nas fantasias, projeções e ilusões do amor.
Ela ficou quieta.
- Por isso dói.
Ambos se calaram, mas ninguém foi embora. A conversa continuaria. ...Um dia.

sábado, 23 de janeiro de 2010

"Vai ficar tudo bem. Tudo no final vai dar certo. Você vai conseguir superar isso. Você vai saber qual caminho seguir. Você vai saber ser quem você é."

Ele, alucinado, sentado no canto de seu quarto. A camisa branca suada, colada no corpo. A respiração ofegante. As mãos segurando tão firme os cabelos na cabeça, acho que temiam que até eles fugissem de controle. Os olhos negros, agora estavam vermelhos e rios desciam pelas pálpebras. Ele, mesmo sentado, jogava o corpo para frente e para trás. As costas, nessa altura do tempo, já deviam estar tomadas de hematomas.

A prisão, que sua cabeça havia se tornado, estava num motim. Todos os pensamentos, as palavras, as visões, as pessoas, as imagens, as paisagens, os poemas, os textos, brigavam entre si. Debatiam-se nas paredes do crânio. E ele continuava a dizer para si. Em voz alta. Pois o externo era impenetrável à caixa da loucura. "Vai tudo acabar bem. As coisas vão se acertar. Você vai poder ser o que sempre quis. "

Mas ele sabia que a paz - utópica, como sempre. - não viria tão cedo.

Hora ou outra ele teria de se levantar daquela encruzilhada de cimento - tanto onde estava quanto onde não estava. - e voltar a viver a vida anfíbia. De um lado um amor. Do outro, um tipo diferente de amor. Ou tão igual que passa a ser estranho.

Naquela noite ele adormeceu ali. De olhos abertos.

As palavras ecoavam, vazias, pelo quarto.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2010



"Hoje foi um dia particular. Especial. Não mais me senti como no meu mundo imaginário. O mundo que me persegue e me confunde e me frustra e... me salva.
Hoje foi algo tão real, tão vivo, tão rubro, quem me salvou. Tirou-me das nuvens e me colocou no chão. Nem reclamei. Os meios que ela utilizou foram tão convincentes, torturadores, mas convincentes, que nem fiz questão de querer voltar. Voltar? Voltar para onde? Onde eu estava? Lugar algum tornou-se existente na minha memória depois da aparição dela.
Ela. Só ela. Que tem o mar verde acinzentado no olhar. Que eu me vejo ali rodar, e rodar, e querer me afogar. Caindo. Sempre caindo naquele labirinto brilhante, tentador, encantador.
Eu caí há um tempo. Vi-me ali, pelo menos. Então ela fechou os olhos e me aprisionou para sempre. SEMPRE. Palavra tão utópica, tão surreal. Nela, tão fixo, tão vingente. Tão meu querer com ela. Ela, só ela, para sempre.
Hoje, mãos macias me presentearam com doces e leves toques. Elas se perderam nos meus cabelos, na minha nuca. Tirou-me do estático e me colocou no inerte. Inerte a um desejo que eu não sabia se era recíproco.
Não sabia até que as luzes foram apagadas, até que o silêncio se fez presente, até que a respiração ficou inconstante, até que meu coração cambaleou em pulos espaçoso, arritmicos por prazer.
Minhas mãos suaram. Meus sentidos se atordoaram. Ela tinha me tomado. Bebeu-me. A boca ficou seca. Eu fui e voltei ao meu mundo irreal. Mundo que eu não largava e que não largava de mim. Mundo que me aprisionava à cabeça, que me colocava em situações constrangedoras, que mostrou a mim que a solidão existe quando, mesmo cercado de vozes e ouvidos, eu não dava atenção às minhas próprias palavras. Mundo que me ensurdecia. Agora eu estava surda com o som do coração dela, afogada no odor mais que atraente, de mãos atadas, disposto a ela, a serviço dela, existindo e respirando e vivendo e sorrindo só para ela. Por ela. E com um medo enorme que ela percebesse isso.
Do hoje eu falo que revivo. Do hoje espero não mais precisar voltar ao mundo fantástico. Ela é tão real e tão viva que eu desejo ter com ela todos os meus sonhos. Complexo? Paradoxo? Louco? Sim, estou louco por uma uma garota que fez de mim respresentante alucinado da felicidade.
Do amanhã? Espero o pra sempre. O pra sempre em cada nascer de sol, em cada sorriso lunar, em cada brilho estelar. O pra sempre em cada brisa morna, em cada dia frio, em cada abrir de olhos no meio da noite chuvosa. O pra sempre indo dormir e acordando com ela aninhada no meu peito. O pra sempre com o cheiro dela tomando o meu corpo. O pra sempre com a voz dela colada no meu ouvido dizendo o que pra mim já basta para viver.
Eu não sei porquê, mas acho que estou amando.
Esse é o tal do amor que me leva e traz da insanidade?
Ou que me mantém nela?
O real tem sido mais insano.
A boca dela cheira canela." 04-10
Pela primeira vez naquela noite, ele teve a coragem de sentar, escrever e ler o que tinha escrito. E não queimou o papel.
Não havia mais medo.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010



A solidão só existe quando, cercados de ouvidos e vozes, não damos atenção às nossas palavras.