sexta-feira, 4 de setembro de 2009




"-Mas todos os dias esse menino tá sentado ali!" - Exclamava ora indignado, ora curioso, o Seu Marcos da vendinha que ficava na esquina da rua.

Mateus todos os dias, no mesmo horário, ia para aquela rua e se sentava na guia da calçada. Ali ficava por horas, até que o sol cansasse de iluminar seus pensamentos, mirando a parede da fábrica abandonada.


O menino era louro, dos olhos azuis que tendiam ao verde. As bochechas rosadas de calor, o cenho vivia franzido por culpa da luz forte e a boca, que mais parecia um morango, havia de ser molhada pela língua várias vezes para não ficar ressequida. Era uma criança linda, de traços finos. E pelos trajes, percebia-se que ele não era daquelas ruas. Devia descer do condomínio não muito longe dali. Devia ser filho de pai rico e mãe "dona de compra". Seu melhor amigo era um peixinho dourado num aquário. Tão mesquinho e solitário quanto ele.

Naquele dia Seu Marcos resolveu questionar o menino:

- Ei, menino! Que você tanto faz aí parado? Olhando pra essa parede?

Silêncio. Mateus continuou com os olhinhos fixos na parede.

- Menino?! Que foi? Um gato comeu sua língua?

Depois desse questionamento, Mateus virou os olhinhos para cima, já que a diferença de idade ali era proporcional à diferença de altura deles. Mas não tardou, retornou aos seus pensamentos para com o muro.

O Muro. Feito de tijolos e muito extenso. Por trás dele, tem-se conhecimento de que havia existido uma fábrica. Nada mais. Um muro como outro qualquer: duro, ereto, vazio.

Seu Marcos sentou-se ao lado do menino e imitou-o. Crianças se irritam quando os adultos tentam imitá-los, fato.

- Não é só uma parede.

- Olha! Ele fala! - silêncio - É o que então?

- É um portal. - respondeu Mateus sussurrando, com a mãozinha em frente a boca.

(...)

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