sábado, 22 de agosto de 2009


Ele estava sozinho mais uma vez.

Sentado numa cadeira de balanço, feita de madeira, entalhada a mão. Ele ia e vinha.
Para frente e para trás.

A cadeira ficava bem em frente à porta da casa. Nos seus pés havia um tapete branco, humilde.
Os braços, descançando sobre os braços da cadeira. As costas confortavelmente recostadas no encosto.

Os cabelos dele, negro, iam de um lado a outro da cabeça, loucos com a brisa. Os olhos, também escuros, estavam brilhantes. As pálpebras com os longos cílios, semicerradas.

Ele ia e vinha. Ia e vinha. A cadeira rangia.

Os movimentos eram despercebidos aos olhos dele que, na verdade, não estavam ali. Aliás, nem os pés dele estavam ali. Dois estavam perdidos no limite entre o azul do céu e o verde do mato. Outros dois estavam perdidos no caminho terroso que abria ao meio o verde do campo.

De repente, o empurrar e ser empurrado, cessaram.

Ela estava naquele caminho, de pé. Ele não estava mais sentado.

- Sabe do que eu não gosto em você? - ele gritou interrogando-a.
- Não. Do que? - ela, calma e serena como sempre, devolveu-lhe com mais uma pergunta.

- Não gosto de como toda a sua face sorri em conjunto. Boca, bochecha e sobrancelhas.

Nada.

- Não gosto do jeito gracioso com que os seus cabelos acompanham o rumo do vento. Da maneira como a sua roupa fica impedida pelo seu corpo de ir junto da brisa.

Só os grilos foram ouvidos no silêncio entre os corpos.

- Não gosto como a intensidade da sua respiração nos nosso momentos de loucura me tomam o fôlego. De como minha boca seca quando você larga os meus dedos. De como eu estremeço quando lembro do seu toque, da suas mãos espalmadas nas minhas costas. De como você vaza pelas minhas mãos tão facilmente.

Ela olhava para ele. Só.

- Não gosto da sua maneira de invadir meus sonhos, estando eu dormindo ou de olhos abertos. E da sua maneira de sair deles, gosto menos ainda.

...

- Não gosto da sensação de tempo estacionado quando seu corpo fica na presença do meu. E de como ele acaba rápido quando você se vira e some. E como ele segue arrastado, como se carregasse sacos de pedras enormes e pesadas, vagaroso, quando meus olhos não podem alcançar o limite da sua existência.

Ela sorriu.

- Mas acima de tudo, apavoro-me com a ideia de não poder definir esse sentimento estranho que pesa no meu peito, que porporciona, a cada palavra dita e não dita sua, uma aceleração dos meus batimentos cardíacos, que molha a minha face de nervoso, que gela minhas mãos, que me atordoa e me tira do sentido, exila-me da área da razão.

Como ela permaneceu sem dizer nada, ele fechou os olhos, como se os piscasse, mas demoradamente, esperando acordar e não mais vê-la.

Ao abri-los, ela estava a milímetros do físico dele. Os olhos castanhos e brilhantes dela olhavam de um olho a outro dele. Esquerdo, direito. Esquerdo, direito. Vagarosamente. Todo o rosto dela sorria.

Sem muito esforço, ela diminuiu os poucos milímetros entre eles, pegando em sua mão carinhosamente.

Colocou-a na altura dos olhos e analisou-a. Cada veia saltada, cada dedo. Fechou-a, abriu-a e analisou todo o movimento enquanto fazia isso. Depois colocou-a levemente sobre o próprio peito e olhou nos olhos dele.

Ele ficou espantado. Não com o ato, mas por não sentir batimento algum tentar romper o peito dela.

Ela desceu as mãos e aproximou o ouvido no peito dele. Lá, quase que pulando para fora, o músculo involuntário dele estava com uma batida incontável de rápida. Ela riu deliciosamente e abraçou-o. Segundos depois a pulsação dele pensou em parar. Talvez para sentir em toda a parte do corpo, a aproximação da ternura dela.

O céu estava azul claro com nuvens brancas, fofas, espaçadas. O sol estava claro, morno. O vento tinha parado, junto do tempo. Ele vestia uma camiseta branca, com a gola num corte em V. Jeans nas pernas. Descalço. Ela vestia um vestido lilás, com uma fita roxa envolvendo a cintura, finindo num laço nas costas. Descalça.

Ela se afastou. Levou a mão direita à bochecha esquerda dele. Com o polegar, acariciou-a, subindo e descendo. Os olhos dela, iam de um a outro dele. Ela, mais uma vez desceu a mão, virou-se e saiu andando.

Poucos metros longe, virou para ele, sorriu, abriu as asas e sumiu.

Como um pulo, sentado na cadeira de madeira, ele acordou ofegante. E podia jurar: os olhos dela, estavam numa cor que tendia ao lilás. Os dele, vazios.

"A pessoa por quem a gente se apaixona é sempre uma invenção." - Romance.

- Cecília.

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